Comentários à 8ª alteração da Lei da Nacionalidade Portuguesa

Comentários à 8ª alteração da Lei da Nacionalidade Portuguesa

Dia 20 de abril de 2018 foi aprovada a 8ª alteração à Lei da Nacionalidade, Lei n.º 37/81, pelo Parlamento Português, encontrando-se pendente de promulgação pelo Presidente da República, para entrar em vigor no dia seguinte ao de sua publicação.

Teço, a seguir, breves comentários à integralidade das mudanças trazidas por essa nova alteração da norma.

Exigência de 2 anos de residência legal de um dos pais estrangeiros do nascido em Portugal, ao tempo do nascimento, para o filho ser tido como português nato – Art. 1.º, n.º 1, al. f), n.º 4

O tempo de residência necessário de um dos pais estrangeiros para que o filho nascido em Portugal seja tido como português passou de 5 para 2 anos. Manteve-se a exigência dessa residência ter se dado de forma legal.

Foi, ainda, definido a forma de comprovação dessa residência legal que se dará por exibição do documento de identificação, designadamente o título de residência, do pai ou da mãe no momento do registro de nascimento do filho.

Aquisição de nacionalidade para os adotados restritivamente – Arts. 5.º e 29.º

A adoção restrita era uma forma de adoção que vigeu até novembro de 2015. Na adoção restrita são mantidos os vínculos familiares do adotado com sua família biológica. Os adotados restritivamente, nos termos da lei, continuam a ser considerados filhos de seus pais biológicos.

Apenas era possível a aquisição da nacionalidade por adoção para os adotados plenamente. Na adoção plena são extintos os vínculos familiares do adotado com sua família biológica, passando a ser definitivamente filho do adotante.

Até então, os adotados restritivamente não tinham direito à aquisição da nacionalidade pelos pais adotivos, apenas os adotados plenamente. Agora qualquer adotado adquire a nacionalidade portuguesa, por mero efeito da lei, desde que a adoção tenha se dado na menoridade por sentença judicial.

Extinção da oposição à aquisição de nacionalidade por efeito da adoção

Foi extirpada da lei da nacionalidade portuguesa a possibilidade de ação judicial de oposição à aquisição de nacionalidade por adoção.

A nacionalidade portuguesa nesses casos vai passar a ser adquirida, definitivamente, por mero efeito da lei. Anteriormente, apesar do entendimento de que era adquirida por mero efeito da lei, havia uma incoerência em se exigir a pronúncia sobre fundamentos de oposição, em especial a ligação efetiva à comunidade portuguesa, e na susceptibilidade de eventual ação de oposição.

Exigência de 5 anos de residência legal para naturalização de maior de idade – Art. 6.º, n.º 1, al. b)

Foi reduzido o período necessário de residência em Portugal de 6 para 5 anos para aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização. Manteve-se a exigência dessa residência ter se dado de forma legal.

Naturalização de menor de idade, nascido em Portugal, filho de imigrantes ilegais – Art. 6.º, n.º 2, al. a)

O menor de idade nascido em Portugal passa a ter direito à naturalização mesmo que seus pais residam ilegalmente em Portugal, desde que, pelo menos um deles, resida há 5 anos.

Até então, havia a necessidade do período de residência referido ter se dado de forma legal.

Naturalização de menor de idade, nascido em Portugal, que tenha concluído um ciclo do ensino básico ou o ensino secundário – Art. 6.º, n.º 2, al. b)

O menor passa a ter direito à naturalização após concluir qualquer ciclo do ensino básico ou após a conclusão do ensino secundário.

O Ensino Básico em Portugal é dividido em três ciclos:

1º Ciclo: 1º, 2º 3º e 4º Anos

2º Ciclo: 5º e 6º Anos

3º Ciclo: 7º, 8º e 9º Anos

O Ensino Secundário é composto pelo: 10º ano, 11º ano e 12º ano.

Até então, o menor precisava concluir o 1º ciclo do ensino básico em Portugal para ter direito à nacionalidade por naturalização prevista neste dispositivo, agora basta a conclusão de qualquer dos ciclos do ensino básico ou o ensino secundário.

Direito subjetivo à naturalização aos nascidos em Portugal, residentes ilegais há 5 anos, filhos de imigrantes ilegais – Art. 6.º, n.º 5

Anteriormente, podia ser concedida a naturalização aos nascidos em Portugal, filhos de estrangeiros, que tivessem permanecido ilegalmente em Portugal nos 10 anos imediatamente anteriores ao pedido.

Com as novas alterações, os nascidos em Portugal, residentes há 5 anos, mesmo que ilegais, filhos de estrangeiro residente em Portugal à época do seu nascimento, mesmo que ilegal, terão direito à naturalização.

Salienta-se que a naturalização em comento deixou de ser uma concessão discricionária, com base na conveniência do Governo, e passou a ser um verdadeiro direito subjetivo. Até então, mesmo preenchidos os requisitos previstos na lei, poderia ser negada a concessão desta nacionalidade por naturalização. Agora, cumpridos os requisitos, o Governo tem o dever de conceder a nacionalidade.

Possibilidade de naturalização para ascendentes de portugueses natos, residentes há 5 anos, mesmo que ilegais – Art. 6.º, n.º 8

Trata-se de nova disposição legal que permite a concessão da nacionalidade para os ascendentes de português originário, residentes, a qualquer título, mesmo que ilegais, há 5 anos, desde que sejam pais biológicos e que a ascendência tenha sido estabelecida no momento do nascimento. Isso significa que o pai que reconhece a paternidade do filho português apenas em data posterior ao nascimento não poderá se naturalizar nesses termos.

Esta concessão de nacionalidade é uma faculdade discricionária do Governo, que, mesmo cumpridos os requisitos legais, pode optar por não a conceder.

Presunção de conhecimento da língua portuguesa para naturais e nacionais de países de língua portuguesa – Art. 6.º, n.º 9

Antes da alteração a presunção de conhecimento da língua portuguesa para os naturais e nacionais de países de língua portuguesa para processos de naturalização apenas se dava após 5 anos de residência em Portugal, com a alteração essa exigência será dispensada.

Não cabimento de oposição à aquisição da nacionalidade pelo casamento ou união estável com fundamento na inexistência de ligação efetiva à comunidade portuguesa quando existam filhos comuns do casal com nacionalidade portuguesa originária – Art. 9.º, n.º 2

No Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, anexo do DL n.º 237-A/2006, já havia previsão de presunção de ligação efetiva à comunidade portuguesa pela Conservatória dos Registos Centrais quando o requerente fosse natural e nacional de país de língua portuguesa e tivesse filhos portugueses natos do casamento ou união que fundamenta a declaração. Nesse caso a Conservatória não podia remeter o processo ao Ministério Público com base na falta de laços de efetiva ligação, mas caso o Ministério Público recebesse o processo por outros motivos, nada o impediria de propor oposição com fundamento na inexistência de efetiva ligação à comunidade portuguesa.

O aditamento ao artigo 9º veio para determinar, de uma vez por todas, de que não é cabível ação de oposição à aquisição de nacionalidade pelo casamento ou união estável por inexistência de laços de ligação à comunidade portuguesa caso hajam filhos portugueses natos oriundos do relacionamento.

Percebe-se, aqui, uma intenção do legislador em zelar pelo princípio da unidade de nacionalidade da família.

Definição da contagem de prazos de residência legal – Art. 15.º

Alteração de suma importância, que veio a pacificar a controvérsia que havia em relação à contagem dos períodos de permanência legal para efeito de atribuições e aquisições de nacionalidade.

A controvérsia era justamente acerca da necessidade de os prazos legais de permanência exigidos serem ininterruptos.

Foi elucidado que para a contagem de prazos de residência legal são somados todos os períodos de residência legal em Portugal, seguidos ou interpolados, desde que decorridos num intervalo máximo de 15 anos.

Reaquisição automática da nacionalidade portuguesa pelas mulheres por efeito do casamento que a tenham perdido na vigência da Lei anterior, Lei 2.098/1959, e que não haja sido lavrado o registro definitivo da perda – Art. 30.º

Na vigência da lei anterior, até 1981, a portuguesa que casasse com nacional estrangeiro perdia automaticamente sua nacionalidade portuguesa.

Antes da nova alteração, a reaquisição da nacionalidade portuguesa nesses casos só ocorria mediante declaração. Agora se dará de forma automática nos casos em que não tenha sido lavrado o registro definitivo da perda da nacionalidade portuguesa.

Nulidade da atribuição, aquisição ou perda da nacionalidade portuguesa fundamentada com base em documentos falsos ou em falsas declarações – Arts. 12.º-A e 12.º-B

Com o propósito de combater as inúmeras falsificações de documentos e declarações que têm ocorrido no âmbito dos processos de nacionalidade portuguesa, o legislativo decidiu por impor uma norma que procurasse impedir a obtenção da nacionalidade portuguesa conquistada por meios fraudulentos.

Com atento ao princípio da prevenção da apatridia, o legislador determinou que, mesmo em casos de fraude documental ou declaratória, não será conhecida a nulidade de processo de nacionalidade que resulte em apatridia do interessado.

O legislador procurou, ainda, preservar os que tenham adquirido a nacionalidade de boa-fé, sem intenção de apresentar documentos falsos, e os que tenham obtido a nacionalidade portuguesa há, pelo menos, 10 anos, determinando que nesses casos, ainda que seja constatada eventual fraude, tais indivíduos não poderiam ter a nulidade de seu processo de nacionalidade conhecida.

Alteração da condenação que obsta a aquisição nacionalidade por naturalização e fundamenta ação de oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade – Arts. 6.º, n.º 1, al. d) e 9.º, n.º 1, al. b)

Tal condenação deixou de ser com base na moldura abstrata, de que a mera condenação por crime abstratamente punível com pena de prisão cujo máximo seja igual ou superior a 3 anos constituiria motivo que vinculada e automaticamente impediria a aquisição da nacionalidade portuguesa, independentemente da pena concreta aplicada, para passar a ser com base na condenação concreta a uma pena de prisão igual ou superior a 3 anos.

Conclusões

A presente alteração traz um abrandamento de diversas exigências para obtenção da nacionalidade portuguesa. Dessas alterações, pode-se observar uma notável preocupação do legislador na aplicação de princípios constitucionais e internacionais relativos à atribuição e à aquisição da nacionalidade, em especial o princípio da unidade de nacionalidade na família.

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